Guterres pede fim da impunidade após morte de 168 funcionários da ONU


O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) pediu, nesta quinta-feira (5), o fim da "impunidade" ao homenagear os 168 trabalhadores das Nações Unidas que morreram "a serviço da paz" em 2024, um ano especialmente devastador em Gaza, onde 126 funcionários foram mortos.
Em declaração à imprensa, em Nova York, António Guterres disse que dos 168 funcionários da ONU (militares, policiais ou civis) que morreram em 2024, a quase totalidade (125) estava a serviço da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA) - amplamente atacada por Israel.
"Mais de um em cada 50 funcionários da UNRWA em Gaza foram mortos nesse conflito atroz. É o maior número de mortes de funcionários na história das Nações Unidas. Alguns foram mortos ao entregar ajuda humanitária; outros ao lado das suas famílias; outros enquanto protegiam os vulneráveis", recordou Guterres, sem mencionar diretamente Israel.
No enclave palestino, devastado pela guerra entre Israel e o grupo islâmico Hamas, a UNRWA é considerada pela ONU, pela maioria dos Estados-membros e outras organizações como a "espinha dorsal" da ajuda humanitária à população.
No entanto, Israel, que cortou todos os contatos com a agência no final de janeiro, acusa-a de servir de cobertura ao Hamas e de que 19 dos seus 13 mil funcionários na Faixa de Gaza estariam diretamente envolvidos nos ataques do grupo radical palestino em 7 de outubro de 2023 em solo israelense, que desencadearam o atual conflito.
"As mulheres e os homens que hoje homenageamos não eram apenas nomes de uma lista. Eram indivíduos extraordinários - cada um deles uma história de coragem, compaixão e serviço. Eram movidos pela busca da paz. Pela urgência de aliviar o sofrimento humano. E pela convicção de que toda pessoa, em qualquer lugar, merece dignidade e proteção", frisou Guterres.
Segundo o ex-primeiro-ministro português, o sacrifício de todos os 168 trabalhadores mortos ao redor do mundo é uma tragédia, mas também um lembrete da responsabilidade que cada funcionário da ONU carrega todos os dias.
Guterres observou que funcionários da ONU que trabalham em conflitos "não procuram reconhecimento, procuram fazer a diferença".
"Quando o conflito irrompe, eles trabalham pela paz. Quando a violência e o desastre acontecem, prestam ajuda que salva vidas. Quando os direitos são violados, manifestam-se", acrescentou.
Diante das adversidades enfrentadas pelos trabalhadores da ONU, António Guterres garantiu que não ficará insensível ao sofrimento e não aceitará o assassinato dos seus funcionários, nem de outros humanitários, jornalistas, profissionais de saúde ou civis "como o novo normal em qualquer lugar e em nenhuma circunstância".
"Não deve haver espaço para a impunidade", insistiu.
Embora "possa parecer moda em certos setores criticar o multilateralismo" - uma alusão velada ao presidente norte-americano, Donald Trump, e outros políticos que têm defendido o isolacionismo -, Guterres salientou: "As contribuições financeiras podem estar em dúvida, mas a dedicação da nossa equipe não".
A ONU tem sido severamente afetada por cortes de financiamento do seu maior doador, os Estados Unidos, após a chegada de Donald Trump à Casa Branca, em janeiro.
Apesar de a carga de trabalho da ONU aumentar de ano para ano, os recursos estão diminuindo em todos os setores, contribuindo para isso o fato de que nem todos os Estados-membros pagam na totalidade as obrigações anuais e muitos também não pagam a tempo.
"Num mundo em que a cooperação está sob pressão, e os nossos desafios estão mais interligados do que nunca, devemos recordar o exemplo dado pelos nossos colegas falecidos e o trabalho feito todos os dias por aqueles que levam o seu legado para a frente", disse o secretário.
E concluiu: "Não vacilaremos nos nossos princípios. Não abandonaremos os nossos valores. E nunca, nunca desistiremos".
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